Acondicionar bem o vazio
Encaixotar o que foi...
Acondicionar bem o passado, vazio de ser, não deixando nenhuma recordação fora de controlo, independentemente do seu peso.
Fazer a limpeza da grande casa que somos, gritando e exercendo o direito e o dever de revolta!
Procurar colocar tudo nos cartões canelados, de resistência ao choque, para que nada volte a escorrer para alguma despensa da alma...
Não saber, mas também, se se pudesse, não temer.
Resistir à morte, que se desejaria como forma de o silêncio se inscrever nos sentidos - não ouvir: já não sou!
Evocar a coragem que se poderia ir buscar no sacudir de lágrimas em terra queimada, acreditando que um dia deixariam de regar a dor.
Sentir o próprio corpo a não resistir ao dia que chega, fechando os olhos em exercício perene de desistência.
Empilhar reveses e estrangulá-los com vísceras de luto.
Plantar a palavra mudança na janela do dia nascente e sentir que, à medida que os dias vão passando, ela desabrocha em caule vergado de cansaço.
Depois, desencaixotar tudo; fazer puzzles do desperdício, e voltar a estragá-los, e voltar a montá-los, e... olhar o entusiasmo dos outros, pintado em rostos de écran brilhante, num filme que já não é o nosso.
Não ter a capacidade de mexer os pés, pela paralisia da surpresa de se passar a ver, novamente, um dedo acusador, quando o que se desejaria era não ser mutilado, nem mutilar, não ser agredido, nem agredir, não ser morto, nem matar!
O cardápio de festim surrealista está todo posto e exposto sobre a mesa - agora basta, a Regina, vomitá-lo...
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