regina - nome de chocolate e de mulher

18 setembro, 2006

Caminhar

Desceu até aos campos de Outono que, discretamente, rodeavam a sua casa-lar.
Um imperativo de corpo, mas muito mais de alma, fê-la entregar-se à urgência de passos com rumo certo e apaziguador.
E olhou a serra, sucedâneo dos seus montes, de Trás-os-Montes! Como ela lamentava o desenraizamento a que teve de se entregar quando, infância concluída, rumou para outros lugares, deixando para trás um universo de aromas e de ar azul - o azul que sempre a acompanhou, muito especialmente, na nostalgia.
Fez a descida do sol, que aguarelava a vegetação de um amarelo-quente, com velaturas de humidade ténue e foi deixando o seu abecedário de lamentações para, em osmose, se ligar às árvores que geravam frutos abaixo das normas impostas pela padronização comercial - cresciam em exemplares discretos, sem que ninguém os olhasse ou apanhasse... Agora, estavam ali para deleite da sua visão e olfacto, com um desusado e genuíno cromatismo de pele. Apanhou alguns bagos de uva, mergulhou os dedos em figos inebriantes e sorriu às rosadas maçãs que, demasiado maduras, produziam um efeito paradoxal... muitas iam apodrecendo, nos próprios ramos, num percurso estranho de morte...
No regresso, já com calor de órgãos e pensamentos, Regina retomou a ideia de que o lugar onde vivia não era, efectivamente, o sítio das suas grandes paixões, mas percebeu que gostava dele; gostava de uma forma não exacerbada...
Então, deixou uma pergunta a circular por dentro de si: não seria bom usar este lugar de vida, sem sobressaltos, para o aplicar, como metáfora, à sua hiperestesia de paixões humanas?